Inicialmente, as políticas públicas instituídas nos últimos anos têm sido consideradas como indutoras das compras governamentais, trazendo um aumento vultoso na realização de obras, prestação de serviços e aquisição de bens, o que resultou na multiplicação de contratos com empresas privadas.

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Buscando o controle e a qualidade do gasto público, exige-se especial atenção às regras impostas pelo Instrumento Convocatório em certames públicos e em relação ao cumprimento dos contratos pelos particulares.

Diante disto, a Administração Pública poderá aplicar sanções aos particulares contratados em face de inexecução total ou parcial do ajuste, balizado na supremacia do interesse público.

A Lei nº 8.666/93, que institui normas para licitações e contratos da Administração Pública, elenca no artigo 87 as sanções administrativas em decorrência da inexecução total ou parcial do contrato, dentre elas, advertência; multa; suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos; declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.

Com o advento da Lei nº 10.520, de 2002, que instituiu o Pregão, houve uma amplitude no nível de competitividade devido às suas peculiaridades, em especial a relacionada à inversão das fases, que traz facilidades à participação de empresas no certame.

Ocorre que, tanto a Lei nº 8.666, de 1993, quanto a Lei nº 10.520, de 2002, incidem em idênticas situações de falhas, fraudes ou de inadimplemento total ou parcial de licitantes ou contratadas e, na medida em que ambas seguem vigentes, deve-se verificar qual é a forma mais adequada para serem aplicadas.

Ao examinar os dois diplomas, verifica-se que há várias diferenças entre as regras da Lei nº 8.666, de 1993 e a Lei nº 10.520, de 2002, dentre as quais é possível destacar que esta última estabeleceu algumas condutas “típicas”, outras genéricas; não trouxe previsão para a sanção de advertência e de inidoneidade, ampliou a pena para o impedimento de licitar e contratar, bem como trouxe a previsão de descredenciamento do sancionado do SICAF, providência não disposta na Lei nº 8.666, de 1993.

Por sua vez, a Lei 14.133/2021, Lei de Licitações e Contratos Administrativos, define no artigo 156 que serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas as seguintes sanções: advertência; multa; impedimento de licitar e contratar; declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.

A natureza das sanções em comento possuem caráter preventivo, educativo e repressivo e, em algumas situações, visa a reparação de danos pelos responsáveis que causem prejuízos ao órgão ou entidade, sob o manto da proteção ao erário e ao interesse público.

Com relação à possibilidade de a Administração aplicar sanções mesmo após o término da vigência contratual, é importante destacar um posicionamento favorável nesse sentido, permitindo eventual aplicação de penalidades em caso de descumprimento de alguma de suas condições, mesmo depois de expirada a vigência contratual.

Diante disto, mesmo sem a previsão legal expressa a respeito de um prazo prescricional para a aplicação das penalidades às licitantes e contratados, fica a cargo da doutrina e jurisprudência a solução para essa questão, sendo que, para ambos, o entendimento utilizado é a utilização pela Administração Pública do prazo prescricional de 5 (cinco) anos.
Notadamente, o Edital deverá trazer as regras inerentes à execução dos contratos. No entanto, nem sempre isso ocorre, sendo que tal fato pode abrir uma margem de atuação e de interpretação da Administração Pública na tomada de decisão quanto à aplicação de sanções.

Nesse aspecto, é volumoso o número de particulares que provocam o Poder Judiciário visando afastar penalidades ou sanções descabidamente aplicadas ou aplicadas de forma desproporcional.

DO RITO DO PROCEDIMENTO QUE VISA APLICAR SANÇÕES ADMINISTRATIVAS

A Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, é aplicável ao procedimento que visa apurar as condutas para aplicação das sanções às licitantes e contratadas de forma residual, ou seja, de forma subsidiária, tendo em vista o contido no art. 69, o qual prevê que “os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta lei.”

Desse modo, os processos administrativos específicos serão regidos pela legislação própria, como é o caso das Leis de Licitações e Contratos Administrativos em vigência (atualmente destaca-se a Lei nº 8.666/93, Lei nº 10.520/2002 e Lei nº 14.133/2021), uma vez que o legislador conferiu aos seus textos requisitos para o procedimento.

Com o fim de facilitar as atividades, o órgão ou entidade contratante poderão, ainda, possuir um arcabouço normativo próprio, a exemplo de portarias ou instruções normativas, que venham a estabelecer competências, atribuições, rito procedimental com todas as fases e prazos, modelos de documentos, dentre outros, elaboradas com amparo na legislação, devendo também estar em consonância com as especificidades e complexidade de sua estrutura administrativa.

DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. DA AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO

Dessa forma, é primordial que exista, dentro do órgão contratante, a abertura de processo administrativo para averiguação dos fatos e eventual aplicação de sanções.

A Constituição Federal traz sustentação em princípios descritos no artigo 5º da Constituição Federal de 1988, quando elenca no inciso LIV que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” e no inciso LV que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Por sua vez, a Lei nº 8.666/93 define no Parágrafo único do artigo 78 que “os casos de rescisão contratual serão formalmente motivados nos autos do processo, assegurado o contraditório e a ampla defesa”.

Tal premissa foi mantida na redação da atual Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei nº 14.133/2021, na qual o artigo 137 define que “constituirão motivos para extinção do contrato, a qual deverá ser formalmente motivada nos autos do processo, assegurados o contraditório e a ampla defesa … ”.

Assim, inicialmente, é de suma importância que o particular exerça o direito de ampla defesa e contraditório em procedimento administrativo instaurado pela Administração contratante, defendendo-se tecnicamente a respeito dos fatos imputados ao mesmo.

Neste aspecto, ressalta-se para a importância de que empresas requeiram e produzam no tramitar do procedimento administrativo todas as provas em direito admitidas, incluindo a realização de perícias, diligências, oitiva de testemunhas, provas emprestadas que se prestem a esclarecer os fatos, utilização de imagens de segurança, dentre outras que incluam o Poder Judiciário visando a quebra de sigilos bancários e telefônicos, por exemplo, com o objetivo de exercer toda espécie de defesa a que tem direito o particular na qualidade de interessado.

Outra forma de defender-se é levar ao conhecimento da Administração Pública situações análogas ou semelhantes às experimentadas pelo particular, utilizando-se de entendimentos jurisprudenciais (decisões) proferidos pelo Tribunal de Contas do Estado, se for o caso, Tribunal de Contas da União e pelo Poder Judiciário em geral, com o intuito de demonstrar o posicionamento dos órgãos de controle, auxiliando, assim, os responsáveis na condução do procedimento.

Neste ponto, realiza-se um recorte para elucidar que os membros da comissão que conduz um processo administrativo que visa a aplicação de penalidades, são, em regra, servidores públicos e, podem exercem essa atividade de forma acumulada com seus cargos de origem e, algumas vezes, sequer possuem experiência para conduzir todo o trâmite do procedimento. São situações que poderão acarretar uma condução processual contaminada por vícios, como descumprimento de prazos ou impedimento de produção de uma prova requerida pelo interessado, por exemplo, e poderá resultar num relatório final contendo a sugestão de aplicação de penalidade desproporcional aos fatos analisados.

O relatório final dos membros da Comissão processante não tem o poder de vincular a decisão da autoridade responsável pela aplicação da pena, porém, na prática, isso pode acontecer.

Tudo isso para demonstrar que a defesa técnica, realizada por uma assessoria jurídica especializada, poderá evitar a aplicação de penalidades administrativas descabidas à empresa contratada ou afastar penalidades desproporcionais aos fatos, assim como encetar todas as formas de defesa em favor do particular processado, incluindo a interposição de recurso, pedido de reconsideração, além de assegurar o direito do contratado à reanálise da decisão administrativa através do direito de petição garantido no artigo art. 5.º, XXXIV, “a” da Constituição Federal.

O direito de petição é definido como o direito dado a qualquer pessoa que invocar a atenção dos poderes públicos sobre uma questão ou uma situação. Essa invocação dos Poderes Públicos pode se dar para que se denuncie uma lesão concreta, para que se peça a reorientação da situação, ou para que se solicite uma modificação do direito em vigor no sentido mais favorável à liberdade. Sendo assim, é um importante instrumento de defesa jurisdicional de direitos.

Assim, mesmo após a fase da defesa escrita ou até mesmo da apresentação do recurso (quando já encerrada a oportunidade de produzir provas), poderá o particular se utilizar do Direito de Petição para levar ao processo informação importante e que tomou conhecimento posteriormente, bem como requerer a produção de prova nova visando esclarecer os fatos e demonstrar a realidade da situação.

Além disso, o particular injustamente sancionado também poderá se socorrer do Poder Judiciário para a reanálise e revisão dos atos e decisões praticados no processo administrativo.

DA REPARAÇÃO DECORRENTE DE PREJUÍZOS PELA ERRÔNEA APLICAÇÃO DE SANÇÕES

A incorreta condução do processo administrativo para aplicação de sanções, comumente quando ocorrer de maneira precipitada, arbitrária ou irregular, quando decorrente da falta de zelo dos responsáveis no momento de recolher as provas suficientes para justificar uma demanda administrativa, muitas vezes, poderá acarretar efeitos prejudiciais na seara particular da empresa sancionada, tais como a necessidade de demissão de funcionários contratados para a execução do objeto contratado acarretando, assim como o descumprimento de ajustes realizados com fornecedores e colaboradores, sem contar o constrangimento perante clientes da atividade empresarial.

Por fim, restando comprovado que o procedimento administrativo sancionador foi processado de forma irregular e trouxe prejuízos ao particular, o Poder Judiciário poderá fixar indenização em face da Administração Pública, se for o caso.

CONCLUSÃO

Como visto, o procedimento administrativo que visa apurar supostas irregularidades decorrentes do certame ou da execução contratual é complexo e exigirá a atuação ativa do contratado em sua defesa, o qual, sendo conhecedor dos direitos que o acompanha e do rito do procedimento, com suas minúcias, formas e prazos, terá condições de reverter eventual posicionamento equivocado da Administração pelos diversos meios que o ordenamento jurídico proporciona.

Diante disto, é essencial que o particular que contrata com a Administração Pública invista em uma assessoria jurídica especializada, a qual assegurará a preservação dos direitos, afastando, por sua vez, a aplicação de penalidades desproporcionais ou até mesmo indevidas em certames públicos.

Mini Bio:
Caroline Mucci. É advogada especialista na área de Direito Público. Head da Área de Direito Público do escritório Zanelato Braga Advogados (e-mail: [email protected])

Notas e Referências:
– CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL – 1988
Acesso: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

– LEI Nº 8.666, DE 21 DE JUNHO DE 1993
Acesso: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8666cons.htm

– LEI No 10.520, DE 17 DE JULHO DE 2002
Acesso: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10520.htm

– LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021
Acesso: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm

– LEI Nº 9.784 , DE 29 DE JANEIRO DE 1999
Acesso: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9784.htm

– Caderno de Logística: SANÇÕES ADMINISTRATIVAS DIRETRIZES PARA FORMULAÇÃO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO ESPECÍFICO
Acesso: https://www.gov.br/compras/pt-br/agente-publico/cadernos-de-logistica/midia/caderno-de-logistica-de-sancao-2.pdf

Marcelo Barros
Jornalista (MTB 38082/RJ). Graduado em Sistemas de Informação pela Universidade Estácio de Sá (2009). Pós-graduado em Administração de Banco de Dados (UNESA), pós-graduado em Gestão da Tecnologia da Informação e Comunicação (UCAM) e MBA em Gestão de Projetos e Processos (UCAM). Atualmente é o vice-presidente do Instituto de Defesa Cibernética (www.idciber.org), editor-chefe do Defesa em Foco (www.defesaemfoco.com.br), revista eletrônica especializado em Defesa e Segurança, co-fundador do portal DCiber.org (www.dciber.org), especializado em Defesa Cibernética. Participo também como pesquisador voluntário no Laboratório de Simulações e Cenários (LSC) da Escola de Guerra Naval (EGN) nos subgrupos de Cibersegurança, Internet das Coisas e Inteligência Artificial. Especializações em Inteligência e Contrainteligência na ABEIC, Ciclo de Estudos Estratégicos de Defesa na ESG, Curso Avançado em Jogos de Guerra, Curso de Extensão em Defesa Nacional na ESD, entre outros. Atuo também como responsável da parte da tecnologia da informação do Projeto Radar (www.projetoradar.com.br), do Grupo Economia do Mar (www.grupoeconomiadomar.com.br) e Observatório de Políticas do Mar (www.observatoriopoliticasmar.com.br) ; e sócio da Editora Alpheratz (www.alpheratz.com.br).