Na história da hidrografia brasileira, algumas das principais efemérides ocorreram durante combates em defesa da pátria, quando os primeiros hidrógrafos brasileiros necessitaram, além da formação técnica, de uma capacidade militar destacada.
É nesse contexto que o Capitão de Fragata MANOEL ANTÔNIO VITAL DE OLIVEIRA marcou de forma indelével a sua contribuição para o país. Nascido em 28 de setembro de 1829, em Recife – Pernambuco, foi admitido como Aspirante na Academia de Marinha em 1843, tornando-se Guarda- Marinha dois anos depois. Em 1849, tomou parte na força que combatia a Revolução Praieira, em Pernambuco.
Em uma época em que os serviços eram executados exclusivamente por estrangeiros, VITAL DE OLIVEIRA foi designado para reconhecer e levantar os rios e a costa marítima da província de Alagoas, em 1855. Os resultados alcançados, consolidados em planos e em uma publicação denominada “Descrição da Costa do Brasil de Pitimbu a São Pedro”, chamou a atenção para a capacidade do jovem tenente, já reconhecido como hidrógrafo.
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Mais tarde, em 1857, exercendo o comando de um pequeno iate, o “Parahybano”, realizou diversos levantamentos hidrográficos ao longo da costa brasileira: desde a Paraíba até Pernambuco; na região do Atol das Rocas; e na Província de Alagoas, entre outras. É o autor do “Roteiro da Costa do Brasil do Rio Mossoró ao Rio São Francisco do Norte”, considerado como a nossa primeira obra hidrográfica.
Com a deflagração da Guerra da Tríplice Aliança, assumiu o comando do Monitor Encouraçado “Silvado”. Nessa ocasião, durante o bombardeio ao Forte de Curupaity, em 1866, tombou sem vida, deixando, para sempre, um legado que o consolidou como o Patrono da Hidrografia Brasileira.
Na guerra, demonstrou liderança e coragem e, na paz, foi um grande marinheiro dedicado aos estudos e à ciência. Seus feitos correram o mundo, proporcionando-lhe diversas condecorações, como a “Legião de Honra”, concedido pela França; a “Ordem de Cristo”, por Portugal; e a “Ordem de São Maurício e São Lázaro”, pela Itália.
Ainda em 1866, durante a mesma guerra, o então Primeiro-Tenente ANTONIO LUIZ VON HOONHOLTZ teve importante participação ao empregar seus conhecimentos hidrográficos no comando da Canhoneira “Araguary”. Junto aos Primeiros-Tenentes ARTHUR SILVEIRA DA MOTA, posteriormente Barão de Jaceguay, e MANOEL RICARDO DA CUNHA COUTO, realizou sondagem no Rio Paraná, debaixo de fogo inimigo, a fim de assessorar na decisão quanto ao melhor local para o desembarque das tropas aliadas em território paraguaio, nos momentos que antecederam a passagem do Passo da Pátria.
Em 1876, baseada nos ensinamentos e na experiência de VITAL DE OLIVEIRA, foi criada a Repartição Hidrográfica, que teve o Capitão de Fragata VON HOONHOLTZ, futuro Almirante e Barão de Teffé, como seu primeiro chefe.
Desde essa época até os dias atuais, a abnegação e a capacitação técnica têm sido as principais características do Serviço Hidrográfico Brasileiro. Nosso pessoal desempenha suas atividades tanto na condução de levantamentos hidrográficos, quanto nas diversas áreas de conhecimento que compõem a Hidrografia em seu sentido mais amplo, com destaque para a Cartografia Náutica; a Geologia e a Geofísica Marinha; a Meteorologia Marinha; a Oceanografia; e a Sinalização Náutica, modernamente denominada como Auxílios à Navegação. Desse modo, é tarefa da Diretoria de Hidrografia e Navegação (DHN) garantir a produção e divulgação das informações de segurança da navegação e do ambiente marinho, a fim de contribuir para a salvaguarda da vida humana no mar, o desenvolvimento nacional e a aplicação do Poder Naval.
Hoje, inspirados nos exemplos de profissionalismo, dedicação e amor à Pátria, não só de VITAL DE OLIVEIRA e VON HOONHOLTZ, mas também de tantos outros brilhantes hidrógrafos, como os Almirantes TORRES E ALVIN, o Barão de Iguatemi; MORAES REGO; GRAÇA ARANHA; RADLER DE AQUINO; ARY RONGEL; PAULO MOREIRA; FRANCO e MAXIMIANO, honramos as gerações de marinheiros e servidores civis que se dedicaram ao nosso Serviço Hidrográfico. Por isso, como resultado desse valoroso trabalho, a comunidade marítima tem recebido diversos produtos confiáveis e de nível internacional por meio das cartas náuticas, dos boletins meteorológicos, dos auxílios à navegação mantidos em funcionamento, e das publicações e normas para a navegação. Por sua vez, a sociedade brasileira tem se beneficiado de previsões meteoceanográficas e avisos de mau tempo com elevados níveis de acerto.
Fruto da dedicação e da incansável busca pela capacitação e aprimoramento profissional de todos os que labutam nas lides hidrográficas, destaco algumas das principais realizações recentes do nosso Serviço:
– Desenvolvimento de trabalhos em conjunto com outros serviços hidrográficos, no momento exercendo os cargos de Presidente da Comissão Hidrográfica Regional da Mesoamérica e Caribe (MACHC), e de Vice-Presidente da Comissão Hidrográfica Regional do Atlântico Sudoeste (CHAtSO);
– No Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira – o LEPLAC, após encerrada a análise da Margem Sul, atualmente os esforços estão concentrados nas respostas para atender aos questionamentos sobre a Margem Equatorial, formuladas pela Comissão de Limites da Plataforma Continental da ONU, responsável por analisar a proposta brasileira;
– A instalação de uma estação meteorológica e o lançamento de três boias de fundeio e de quarenta boias de deriva no estreito de Drake, para o monitoramento das condições de ondas, ventos e correntes na região Antártica;
– O lançamento de quatro boias meteoceanográficas por Navios do Grupamento de Navios Hidroceanográficos (GNHo), no âmbito do projeto REMO Observacional, em parceria com a Petrobras;
– A conclusão de uma nova versão do aplicativo “Sistema de Previsão de Correntes de Maré em Águas Rasas” (SISCORAR), com a inclusão da área da Baía de Santos;
– O desenvolvimento e a homologação do geoportal da Infraestrutura de Dados Espaciais Marinhos, a fim de disponibilizar, catalogar, padronizar e integrar os dados e informações abertos produzidos ou mantidos pela DHN;
– A utilização de drones nas atividades de aquisição de dados em aerolevantamentos;
– A criação de Cursos de Aperfeiçoamento Avançado para Praças, nas modalidades semipresencial e a distância;
– A aquisição de duas novas estações de transmissão de correções diferenciais de posicionamento por satélite, o DGNSS, para as futuras instalações na Ilha da Moela, em Santos, e em Paranaguá;
– A realização da Comissão Pirata XXII, pelo Navio Oceanográfico Antares, que efetuou manutenção e rodízio das boias sob a responsabilidade do Brasil, até a latitude 15oN. Nessa ocasião, foi reativada a coleta de dados meteoceanográficos locais, o que contribui para o monitoramento das interações entre o oceano e atmosfera no Atlântico Tropical e na previsão de tempestades na zona equatorial;
– A conclusão da primeira docagem do Navio de Pesquisa Hidroceanográfico Vital de Oliveira, prevista no Acordo de Cooperação para a Governança do Navio, assinado entre a Marinha, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, a Petrobras, o Serviço Geológico do Brasil e a Vale;
– O encerramento, com êxito, após mais de 180 dias de comissão, da quadragésima Operação Antártica, que marcou a retomada dos projetos de pesquisa de campo e pleno uso dos laboratórios da nova Estação Antártica Comandante Ferraz, a despeito dos desafios impostos pela pandemia da COVID-19. O Navio Polar Almirante Maximiano e o Navio de Apoio Oceanográfico Ary Rongel prestaram relevantes apoios para a análise de dados meteorológicos e oceanográficos, como a conclusão do Levantamento Hidrográfico no Estreito de Bransfield, as coletas de amostras de fundo, os mergulhos para coleta de dados biológicos, bem como os estudos direcionados à fauna, flora e fósseis do Continente Antártico; e
– A marcante participação do Navio Hidroceanográfico Faroleiro Graça Aranha, no Uruguai, no evento anual da Comissão Hidrográfica do Atlântico Sudoeste (CHAtSO) e da Aliança Regional para a Oceanografia no Atlântico Sudoeste Superior e Tropical (OCEATLAN), fortalecendo a influência do Brasil junto à Organização Hidrográfica Internacional e à Comissão Oceanográfica Intergovernamental, além de estreitar os laços de amizade com os países da América do Sul representados nesses grupos.
Ademais, é relevante noticiar que o CAMR encontra-se organizando a “20a Conferência Internacional da IALA”, que ocorrerá no Rio de Janeiro, em 2023. Estima-se que mais de quinhentos delegados, representando mais de noventa nacionalidades, participem do evento, que será o maior já realizado na América Latina sobre Segurança da Navegação. Hoje, o Brasil ocupa a Vice-Presidência da IALA, existindo a expectativa de que nosso país venha assumir futuramente a Presidência dessa importante Associação Internacional.
Como já é tradição na nossa Marinha, militares e servidores civis estão sendo agraciados com o título de “Hidrógrafo Honorário”, pelos relevantes serviços realizados em prol da hidrografia brasileira. Parabenizo todos os 23 homenageados, na certeza de que continuarão a oferecer suas valiosas colaborações em favor da nossa Repartição Hidrográfica.
Além disso, neste ano, com muito orgulho e satisfação, anuncio que será concedido o prêmio “Mérito Hidrográfico” ao Contra-Almirante PAULO CEZAR DE AGUIAR ADRIÃO, em reconhecimento aos serviços prestados, considerados altamente relevantes para a hidrografia brasileira. Desde a sua criação, esse prêmio foi outorgado apenas quatorze vezes.
Por fim, com o entusiasmo característico do verdadeiro espírito hidrográfico e marinheiro, congratulo-me, neste Dia do Hidrógrafo, com todos os homens e mulheres que contribuem diariamente para a grandeza da hidrografia e para manter vivas as tradições do nosso querido “Bode Verde”. Concito-os, então, a renovarem o fogo sagrado que mantém vivos os compromissos de humildade e de perseverança, tão bem traduzidos no nosso lema: “Restará sempre muito o que fazer…”
RENATO GARCIA ARRUDA
Vice-Almirante
Diretor