Imagem: Univali

Cap Paulo Rafael Ferreira Bastos

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A Inteligência Emocional (IE) está intrinsecamente ligada às atividades militares. A importância dessa habilidade pode ser claramente constatada durante o gerenciamento de crises e no exercício da liderança. No âmbito do Exército Brasileiro, o Sistema de Gestão do Desempenho (SGD) é utilizado, desde o ano de 2015, para a avaliação dos militares de carreira em diversas competências que constituem a IE, tais como: tato, liderança, camaradagem, persistência e estabilidade emocional, comprovando sua relevância no contexto militar.

O SGD tem por objetivo avaliar e gerenciar o desempenho profissional dos militares por intermédio da observação de habilidades que, frequentemente, são evidenciadas pela IE. Essa avaliação subsidia os processos seletivos e de promoção pela análise das diversas competências. Tais aspectos, associados a outras características como autoestima, motivação e empatia, estão diretamente associados ao chamado Quociente Emocional (QE).

Há quase trinta anos, o psicólogo americano Daniel Goleman reforçou a quebra do paradigma de que o Quociente de Inteligência (QI) determinaria a capacidade e o desempenho de um indivíduo. De acordo com Goleman, por mais alto que fosse o QI de uma pessoa, sua elevada capacidade profissional seguramente seria prejudicada diante da falta de habilidade emocional, evidenciando um baixo QE.

Surge, então, o conceito de Inteligência Emocional como sendo a capacidade de reconhecer e controlar as emoções, transformando-as em atitudes positivas. Além dessa capacidade intrapessoal, esse tipo de inteligência também auxilia a interação com as outras pessoas, nas chamadas relações interpessoais.

A emoção é originada por um estímulo externo, apresentando-se como um conjunto de alterações que são percebidas pelo corpo. É a ativação de reações (aceleração cardíaca, sudorese, tremores etc.) por todo o organismo, geradas por situações que fujam à normalidade.

Com o aperfeiçoamento dos estudos dos diferentes tipos de inteligência, constatou-se que a IE é uma habilidade que pode ser desenvolvida e que não há, necessariamente, uma correlação direta entre o QE e o QI, já que a emoção e a cognição são controladas por partes distintas do cérebro. Mas, afinal, como o militar pode desenvolver essa habilidade?

O primeiro passo é o autoconhecimento, a identificação das próprias emoções. O militar deve conhecer a si mesmo e ter a consciência da alteração do seu estado de normalidade, buscando controlar seus impulsos e perceber suas reações físicas às emoções, o que possibilitará atitudes conscientes para a solução de um problema em uma situação crítica.

Uma outra forma de desenvolver a IE é a adoção de uma postura otimista e resiliente perante os acontecimentos. Pessoas que costumam ter conclusões imediatamente negativas diante de incertezas sofrem antecipadamente, tendo um desgaste emocional, muitas vezes, desnecessário. A exemplo disso, um sargento comandante de grupo deverá buscar ser uma referência de otimismo para seus subordinados, caso contrário, poderá desmotivar o grupo, prejudicando o cumprimento da missão.

Outro fator que contribui para o crescimento da IE é a manutenção de um bom ambiente de trabalho. Podemos observar as atividades de uma subunidade. Por mais árdua e estressante que seja a tarefa a ser executada por seus integrantes, um ambiente onde haja respeito, justiça e uma comunicação fluida confere aos militares a sensação de segurança e de pertencimento ao grupo, o que propiciará uma maior produtividade.

A leitura dos sinais não verbais emitidos pelas pessoas também é mais uma forma de se ampliar a IE. Desse modo, um militar chefe de seção que exercita a atenção e a preocupação genuína para com os subordinados permite que as dificuldades e necessidades dos indivíduos sejam mais facilmente identificadas. Assim, pode-se atuar pontualmente na solução de atritos e desentendimentos, contribuindo para a mitigação de problemas pessoais ou profissionais.

Nesse contexto, diante de um ambiente de rígida estrutura hierárquica e disciplinar, composto por uma coletividade por vezes heterogênea, deve-se exercitar a IE de modo a cultivar os laços interpessoais, valorizando as potencialidades dos indivíduos e estimulando a correção de suas deficiências.

Diante disso, observa-se que ânimo, empatia e conduta exemplar são atributos evidenciados em líderes com alto QE. Tais atributos fomentam a automotivação nos subordinados, gerando um ambiente produtivo de trabalho em equipe. É o processo de impelir o grupo a ir “além do dever”.

Ressalta-se, ainda, como um fator extremamente importante da aplicação da IE, seu reflexo positivo em relação à saúde física e mental. Seu desenvolvimento também auxilia na prevenção de transtornos psicológicos, como ansiedade e depressão. As doenças psicossomáticas são fruto da dificuldade de se lidar com as emoções, somada à pressão profissional e ao “bombardeio” diário de informações. Esses desafios que se configuram na nova “Sociedade 5.0” tornam-se patentes também no meio militar, principalmente na atual conjuntura que o mundo atravessa.

Em síntese, a IE não deve ser entendida como a supressão das emoções, e sim, como a capacidade de controlá-las e de conseguir reconhecer, de maneira empática, as emoções alheias, de modo a responder aos desafios diários com alto grau de equilíbrio e resiliência.

Verifica-se também que o SGD é uma importante ferramenta de medição e avaliação de recursos humanos, propiciando o autoaperfeiçoamento da IE por intermédio do recebimento de feedbacks verticais e laterais quanto ao desempenho dos militares avaliados.

Por fim, conclui-se que a IE é uma habilidade que deve ser desenvolvida por meio da autoconsciência e da dedicação às relações interpessoais, ressignificando experiências negativas e transformando as emoções em atitudes que impactem positivamente a solução dos conflitos pessoais.