Manaus – AM: No último dia 23 de novembro, a terceira fase de pesquisas da expedição ‘Boto da Amazônia’, realizada pela Sea Shepherd em parceria com o INPA, chegou ao fim. Foram 19 dias de expedição pela bacia do Rio Amazonas.

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A pesquisa teve como objetivo mapear a saúde populacional e aprofundar os conhecimentos científicos sobre o boto-cor-de-rosa, também conhecido como boto-vermelho ou boto amazônico (Inia geoffrensis) e o tucuxi (Sotalia fluviatilis). As duas espécies estão em grande risco de extinção, dentre outros fatores, também devido à emalhes em redes de pesca e matança para uso destes animais como isca para a prática ilegal da pesca de piracatinga (Calophysus macropterus).

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Liderados pelo Dr. Juan Pablo Torres-Florez, PhD especialista em mamíferos aquáticos e coordenador técnico da Sea Shepherd no Brasil, e pela bióloga Dra. Sannie Brum, doutora em ecologia populacional destas espécies, a pesquisa contou com mais quatro cientistas do Laboratório de Mamíferos Aquáticos do INPA e quatro pesquisadores da Sea Shepherd.

Também a bordo estiveram Nathalie Gil, líder da expedição e CEO da Sea Shepherd no Brasil, Caio Rodrigues, gerente da embarcação e documentarista, e Lucas Amorelli, fotógrafo e documentarista experiente nas operações da Sea Shepherd no Brasil e no exterior. Krystal Roberts, chef de cozinha vegana experiente nas expedições mundiais da Sea Shepherd, e Felipe Alves, chef de cozinha vegana, foram responsáveis pela alimentação à base de plantas dos membros da expedição, seguindo a política da organização.

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Nestes 19 dias de pesquisa, foram percorridos mais de 1.000 km de rios, lagos e paranás (canais que ligam rios ou lagos), com foco em quatro áreas:

● Manacapuru, área de alta incidência de pesca e também famosa pela pesca da piracatinga, um tipo de peixe que é pescado com iscas feitas de carne de boto;

● Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Piagaçu – Purus, área reconhecida mundialmente por ter a maior densidade de golfinhos de rio no mundo;

  • RDS Mamirauá, localidade onde foram realizados os estudos mais aprofundados sobre as duas espécies de botos;

  • Região do lago Badajós, também considerada de grande incidência destas espécies.

Estas localidades foram estrategicamente escolhidas para permitir a comparação entre áreas de alta incidência de pesca com áreas de manejo controlado, além de contrastar áreas de rios largos com áreas de paranás mais estreitos. A pesquisa foi bem sucedida mesmo com os desafios de um nível de água mais baixo que o de outras expedições.

Foram identificados 1.387 botos amazônicos e 3.107 tucuxis em cerca de 1.010 km de rio. Em comparação com o mesmo período do ano passado, em que foram monitorados 1.371 botos amazônicos e 3.114 tucuxis, o número é estável estatisticamente.

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Além disso, foram encontrados 185 pontos com atividade de pesca, o que sinaliza um aumento de 39%. A ameaça que a pesca representa a essas espécies se revelou logo nas primeiras 24 horas da expedição. A equipe da Sea Shepherd encontrou dois tucuxis mortos em diferentes pontos da ‘zona vermelha’ para os golfinhos de rio na Amazônia, na região de Manacapuru. Essa é uma zona conhecida pela pesca de arrastão (método com rede à deriva) intensiva, que é ainda mais predatória na época de seca do rio Solimões, e pela pesca ilegal de piracatinga.

Um dos tucuxis foi encontrado com o rostro (‘bico’) amarrado em linha, uma prática para manter o animal preso, vivo ou morto. É um ato de crueldade que pode ter sido feito para evitar que o animal retornasse à atividade de pesca após o emalhe. O outro, após necrópsia realizada pela equipe científica do INPA e Sea Shepherd, teve a causa da morte inconclusiva, mas não descarta-se a possibilidade de interação com a pesca também.

Em todas as três expedições realizadas até o momento, já foram encontrados seis botos mortos, dos quais quatro vieram dessa mesma região. Três deles tiveram claros indícios de morte por interação com pesca. Nessa mesma área, a equipe também já flagrou atividades ilegais de pesca de piracatinga.

“Esta é uma indicação de que mesmo com uma lei vigente que proíbe a caça de botos, é necessário um trabalho de conscientização e fiscalização mais presentes”, relata Juan Pablo Torres-Florez, coordenador técnico da Sea Shepherd.

Em artigo co-autorado entre Sea Shepherd e INPA para a Comissão Internacional Baleeira deste ano, mostra-se a correlação de alta atividade de pesca e baixa presença de tucuxis. Os avistamentos da expedição reforçam esta conclusão.

Além disso, os resíduos são forte foco do estudo, já que são uma ameaça direta à saúde do rio. O projeto também busca desenvolver a gestão de resíduos nas comunidades no entorno do projeto, como as cidades de Beruri, Anori e a comunidade de Cuiuanã.

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Durante a contagem na viagem, foram também identificados 616 pontos de lixo no rio, um aumento de mais de 877% em comparação ao mesmo período do ano passado (63 pontos). Isso porque, nesta terceira fase, um dos cientistas da equipe da Sea Shepherd se dedicou à contagem de resíduos com a mesma qualidade da contagem de animais.

Ao todo, a expedição é composta por seis fases, com previsão de finalização em 2024, mas pode se estender. A pesquisa visa complementar um renomado estudo de mais de 25 anos de leitura populacional destas duas espécies de botos, liderado pela Dra. Vera da Silva, chefe do Laboratório de Mamíferos Aquáticos do INPA.

Foi esse estudo que permitiu a identificação de um declínio populacional alarmante para as espécies, estimando que, infelizmente, as populações de botos amazônicos e tucuxis são reduzidas pela metade a cada 9 ou 10 anos.

Os dados levaram a IUCN, órgão que define o status de conservação das espécies no mundo, a considerar os dois tipos de botos como ameaçados de extinção. Mas a velocidade de seu declínio, em especial devido à pesca ilegal da piracatinga, indicam que elas podem estar mais ameaçadas do que se imagina. Logo, a execução desta pesquisa se torna urgente, trazendo evidências sobre o real estado de conservação desses animais em mais pontos do rio.

“Por serem animais de topo de cadeia, a extinção dos botos pode desencadear um equilíbrio ecológico, já que suas presas se multiplicam sem seleção. Já é sabido que um ambiente com mais botos e tucuxis é um ambiente mais biodiverso – e a biodiversidade na América Latina, conforme estudo recente, demonstra a maior queda: 94% está em declínio”, explica Nathalie Gil, líder da expedição e CEO da Sea Shepherd Brasil.

A pesca da piracatinga, um peixe que normalmente se alimenta de carne morta, é geralmente feita com armadilhas específicas, como caixas de madeira ou um curral feito de rede fina, como um mosquiteiro, onde o pescador utiliza carne de jacaré ou de boto – ambas espécies cuja caça é proibida – para atrair os peixes à armadilha.

Desde os anos 2000, essa prática tem aumentado, o que resultou em uma moratória para proibir a pesca e comercialização da piracatinga, vigente desde 2015. Em junho, a moratória foi prorrogada por mais um ano, uma decisão tomada pela Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

A Expedição Boto da Amazônia depende de doações de apoiadores, patronos e empresas amigas da Sea Shepherd. Para apoiar este estudo, acesse www.botodaamazonia.org.br.

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Resultados interim Expedição Boto da Amazônia III

Expedição Boto da Amazônia I (Outubro 2021)

  • 1371 botos (1,16 botos /km)
  • 3114 tucuxis (2.64 tucuxis /km)
  • Waste points 63
  • Fishing points 133
  • 1.179,1km

Expedição Boto da Amazônia III (Novembro 2022)*

  • 1387 botos (1,37 botos /km)
  • 3107 tucuxis (3.08 tucuxis /km)
  • Pontos com resíduos 616
  • Pontos de pesca 185
  • 1.010km

*atenção: dados ainda não verificados e calibrados

Imagens da Sea Shepherd Brasil