TikTok censura vídeos de jornalistas militares; mas vídeos ilegais seguem no ar

Militar brasileiro com câmera e helicóptero ao fundo.
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Plataforma chinesa intensifica remoções de vídeos relacionados às Forças Armadas, enquanto conteúdos ilegais seguem no ar

Desde meados de 2023, diversos jornalistas e criadores de conteúdo da área de Defesa e Segurança vêm enfrentando uma série de sanções unilaterais por parte do TikTok — plataforma chinesa com mais de 1 bilhão de usuários ativos mensais. O problema vai além de simples quedas de vídeos: trata-se de uma aparente política seletiva de moderação que atinge especialmente conteúdos que abordam o universo militar, mesmo quando são feitos de forma profissional, em ambientes controlados e com autorização oficial das Forças Armadas.

A Situação Vivida por Jornalistas Especializados em Defesa

Profissionais que atuam na cobertura de treinamentos militares, doutrina operacional e valorização das tropas têm relatado que seus vídeos estão sendo removidos sistematicamente pela plataforma sob alegações genéricas como “violação das diretrizes comunitárias”, principalmente por suposta exibição de armas de fogo — mesmo quando manuseadas por militares habilitados, em ambiente institucional, e sem exposição de táticas ou conteúdos sigilosos.

Um caso emblemático envolve um jornalista que mantém um canal ativo no TikTok com foco na valorização das Forças Armadas. Em seu conteúdo, ele exibe trechos de treinamentos supervisionados, momentos cívicos como o hasteamento da bandeira nacional e entrevistas com profissionais da defesa. No entanto, os vídeos têm sido derrubados sem explicações claras ou possibilidade efetiva de recurso humano — enquanto outros conteúdos, inclusive ilegais segundo a legislação brasileira, continuam circulando livremente na plataforma.

Notificação de conta e remoção de vídeo em plataforma.
Todos os recursos são rejeitados

“Por uma imprensa livre e sem ideologia política a restringindo.”
Em tempos de censura velada e controle narrativo por algoritmos, reafirmar esse princípio não é apenas necessário, é urgente. Luiz Camões

Legitimidade Jurídica do Conteúdo Militar Jornalístico

No entanto, esse tipo de conteúdo é totalmente amparado pela legislação federal brasileira. A Constituição Federal, em seu Artigo 5º, inciso IX, garante que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Além disso, o Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2003) não proíbe a exibição de armas em reportagens ou documentários jornalísticos, especialmente quando feitas sob responsabilidade e dentro de ambientes controlados, como bases militares ou campos de instrução — o que é o caso de coberturas acompanhadas por jornalistas especializados.

Portanto, não há qualquer base legal para que tais conteúdos sejam sistematicamente derrubados por plataformas digitais. O que se observa é uma interpretação arbitrária e, possivelmente, ideologizada das chamadas “diretrizes comunitárias”, o que impõe barreiras à livre atuação do jornalismo especializado, mesmo quando este tem o objetivo de valorizar o trabalho constitucional e legítimo das Forças Armadas brasileiras.

Conteúdos Permitidos x Conteúdos Censurados

Galeria de memes e frases do dia.
Intitulados como “memes” a divulgação é realizada livremente na plataforma, Imagem: Plataforma TikTok

É flagrante a disparidade de tratamento. Perfis que promovem:

  • Alistamento para conflitos internacionais,

  • Conteúdos sexualizados com trajes íntimos,

  • Promoção do uso de cigarros eletrônicos (vapers),

  • Indução ao uso de entorpecentes disfarçados por códigos como “F1”,

  • Desafios que colocam vidas em risco,

têm ampla circulação e, muitas vezes, engajamento impulsionado por algoritmos da própria plataforma. Em contraste, vídeos que simplesmente mostram um soldado marchando, um blindado sendo deslocado em área rural ou um momento de formatura cívica, são derrubados com base em critérios questionáveis.

TikTok e o Debate sobre Censura Algorítmica

Em janeiro de 2024, uma matéria do Olhar Digital trouxe à tona diversas denúncias de criadores de conteúdo político e jornalístico que tiveram seus vídeos removidos, gerando forte repercussão. Especialistas apontam que o TikTok vem aplicando políticas de moderação automatizada que favorecem determinados tipos de conteúdo — principalmente de cunho recreativo e despolitizado — ao passo que penaliza material jornalístico e técnico, especialmente quando trata de temas como segurança, defesa nacional ou patriotismo.

Segundo o professor Sérgio Amadeu, pesquisador em políticas digitais, “as grandes plataformas estão se tornando verdadeiros editores globais de informação, decidindo o que pode ou não ser visto, fora de qualquer critério transparente e democrático”.

Vídeos sobre alistamento de brasileiros na Legião Estrangeira.
A divulgação é realizada livremente na plataforma. Imagem: Plataforma TikTok

O Que Dizem as Diretrizes e a Legislação Brasileira

As diretrizes do TikTok são genéricas e subjetivas em muitos pontos, especialmente sobre o uso de armas de fogo. Elas proíbem a exibição “irresponsável” de armas, mas não especificam situações jornalísticas ou educacionais — lacuna que tem sido usada para derrubar conteúdos legítimos.

Vale lembrar que, no Brasil, o trabalho jornalístico é protegido pela Constituição Federal (Art. 220), e a atividade militar é reconhecida como essencial à soberania nacional. Reportagens e vídeos feitos com autorização das instituições militares e em locais controlados não devem ser enquadrados como infrações, especialmente quando não há apologia, incitação à violência ou divulgação de táticas sigilosas.

Estamos Vivendo uma Nova Forma de Censura?

O termo “censura” é pesado, mas cada vez mais usado quando plataformas privadas impõem regras obscuras que limitam o acesso à informação. Ao decidir, unilateralmente, o que deve ou não ser exibido, empresas como o TikTok acabam por exercer um poder semelhante ao de um editor de mídia — mas sem estar submetido às mesmas obrigações legais e éticas da imprensa tradicional.

A ausência de canais eficazes para contestação de remoções, a falta de transparência nos critérios adotados, e a disparidade entre o tratamento de conteúdos legais e ilegais evidenciam uma preocupante realidade: jornalistas especializados estão sendo silenciados não pelo Estado, mas por empresas privadas que operam sem controle social ou institucional no Brasil.

Soldado filmando, bandeira do Brasil e censura digital.
Imagem gerada por IA sobre o tema

Reflexão Final

É necessário que o debate sobre liberdade de expressão nas plataformas digitais seja aprofundado, com participação ativa da sociedade civil, órgãos reguladores, instituições de imprensa e, especialmente, os próprios usuários. Se jornalistas comprometidos com a valorização das Forças Armadas estão sendo censurados enquanto vídeos ilegais prosperam, não estamos apenas diante de uma contradição — mas de um risco real à informação plural e democrática.

Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2003)
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.826.htm

Constituição Federal, em seu Artigo 5º, inciso IX
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htmhttps://www.jusbrasil.com.br/topicos/10730738/inciso-ix-do-artigo-5-da-constituicao-federal-de-1988

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Marcelo Barros
Jornalista (MTB 38082/RJ). Graduado em Sistemas de Informação pela Universidade Estácio de Sá (2009). Pós-graduado em Administração de Banco de Dados (UNESA), pós-graduado em Gestão da Tecnologia da Informação e Comunicação (UCAM) e MBA em Gestão de Projetos e Processos (UCAM). Atualmente é o vice-presidente do Instituto de Defesa Cibernética (www.idciber.org), editor-chefe do Defesa em Foco (www.defesaemfoco.com.br), revista eletrônica especializado em Defesa e Segurança, co-fundador do portal DCiber.org (www.dciber.org), especializado em Defesa Cibernética. Participo também como pesquisador voluntário no Laboratório de Simulações e Cenários (LSC) da Escola de Guerra Naval (EGN) nos subgrupos de Cibersegurança, Internet das Coisas e Inteligência Artificial. Especializações em Inteligência e Contrainteligência na ABEIC, Ciclo de Estudos Estratégicos de Defesa na ESG, Curso Avançado em Jogos de Guerra, Curso de Extensão em Defesa Nacional na ESD, entre outros. Atuo também como responsável da parte da tecnologia da informação do Projeto Radar (www.projetoradar.com.br), do Grupo Economia do Mar (www.grupoeconomiadomar.com.br) e Observatório de Políticas do Mar (www.observatoriopoliticasmar.com.br) ; e sócio da Editora Alpheratz (www.alpheratz.com.br).

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