O PLANO DE CONTROLE TERRITORIAL E A GARANTIA DA LEI E DA ORDEM EM EL SALVADOR

Resumo

Este artigo de opinião tem como objetivo apresentar aspectos do Plano de Controle Territorial e do emprego das Forças Armadas de El Salvador na Garantia da Lei e da Ordem (GLO), no contexto do Regime de Exceção instaurado no país em 2022. Para isso, traçou-se um breve histórico político do Estado, delimitando seu território e destacando algumas de suas características geográficas. Além disso, buscou-se identificar as principais lideranças no combate às pandillas, detalhar as fases do Plano de Controle Territorial e ressaltar o papel das Forças Armadas na GLO. Por fim, são analisados os fatores que levaram à adoção do Regime de Emergência, bem como os resultados alcançados até o momento.

1. INTRODUÇÃO

A República de El Salvador, um pequeno país da América Central, tem ganhado destaque internacional devido às transformações significativas, especialmente nas expressões política e militar.

Banhado ao sul pelo oceano Pacífico, El Salvador faz fronteira a oeste com a Guatemala, ao norte com Honduras e a leste com o Golfo de Fonseca, que o separa da Nicarágua. Com um território de aproximadamente 21 mil km², é um dos países mais densamente povoados da região, abrigando cerca de 6,7 milhões de habitantes. Atualmente, o Estado trava uma guerra declarada contra as maras ou pandillas, organizações criminosas (ORCRIM), responsáveis por espalhar terror e prejuízos, por meio de extorsões e outros crimes.

Historicamente, El Salvador foi governado por regimes militares entre as décadas de 1930 e 1970, seguido por uma sangrenta guerra civil entre 1980 e 1992. O conflito opôs grupos de esquerda, liderados pela Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN), às forças do Estado, resultando em significativos retrocessos estruturais. Após o fim da guerra, o país experimentou um longo período de alternância política entre seus dois principais partidos, a Aliança Republicana Nacionalista (ARENA) e a FMLN. No entanto, em 2019, essa dinâmica foi quebrada com a eleição de Nayib Bukele, que, filiado a um pequeno partido, rompeu com o fisiologismo político e declarou guerra às gangues e à corrupção que assolavam o país.

A seguir, serão apresentados alguns aspectos do Plano de Controle Territorial e do emprego das Forças Armadas de El Salvador em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), no contexto do Regime de Exceção implementado sob o governo do presidente Nayib Bukele.

2. DESENVOLVIMENTO

a. Identificação das Lideranças e das principais maras/pandillas

Do lado estatal, a principal liderança é o presidente Nayib Armando Bukele Ortez. O jovem político e empresário salvadorenho foi eleito em 2019 com 53,1% dos votos, pelo partido Grande Aliança pela Liberdade Nacional. Em 2024, com apenas 43 anos, foi reeleito com uma vitória esmagadora, obtendo 88,3% dos votos, desta vez filiado ao partido Novas Ideias.

Ao assumir a presidência em 2019, Bukele implementou o Plano de Controle Territorial, intensificou o combate à corrupção e criou a Comissão Internacional contra a Impunidade. Essas medidas lhe garantiram ampla popularidade e altos índices de aprovação.

Em 2020, com apoio das Forças Armadas, cercou a Assembleia Legislativa para exigir recursos destinados à continuidade do Plano de Controle Territorial, que já apresentava resultados expressivos. Esse episódio gerou uma crise institucional entre os poderes Legislativo e Executivo.

Em 2021, seu partido, Novas Ideias, conquistou maioria na Assembleia Legislativa. Com isso, houve a destituição de juízes da Suprema Corte e do Procurador-Geral da República, sob a justificativa de envolvimento em corrupção e resistência à implementação de medidas de combate à COVID-19. As ações geraram críticas internacionais, acusando Bukele de centralização de poder. Em resposta, ele declarou:

“A nuestros amigos de la comunidad internacional: queremos trabajar con ustedes, comerciar, viajar, conocernos y ayudar en lo que podamos. Nuestras puertas están más abiertas que nunca. Pero con todo respeto: estamos limpiando nuestra casa… y eso no es de su incumbencia.”

Em 2022, após uma onda de assassinatos supostamente cometidos por integrantes das pandillas em represália ao Plano de Controle Territorial, a Assembleia Legislativa aprovou o Regime de Exceção. A medida suspendeu algumas liberdades individuais em favor de um maior controle da segurança pública.

Outras lideranças relevantes na implementação do Plano incluem:

• Vice-almirante René Francis Merino Monroy – Ministro da Defesa;
• Vice-almirante Exon Oswaldo Ascencio Albeño – Chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas; e
• Mauricio Arriaza Chicas – Diretor-Geral da Polícia Nacional Civil, falecido em setembro de 2024 em um acidente aéreo na fronteira com Honduras, enquanto transportava um suspeito de crime financeiro.

Para entender o desafio enfrentado pelo governo, é fundamental conhecer as principais ORCRIM que atuam no país: a Mara Salvatrucha (MS-13) e El Barrio 18. Ambas são gangues internacionais surgidas na década de 1980, em Los Angeles, Califórnia.

A Mara Salvatrucha, (MS-13) possui esse nome por combinar três elementos: Mara (gangue), Salva (referência a El Salvador) e Trucha (gíria para “espertos” ou “malandros de rua”). O número 13 faz referência à posição da letra “M” no alfabeto.

Inicialmente formada para proteger imigrantes salvadorenhos de outras gangues em Los Angeles, a MS-13 se expandiu por toda a América Central. Suas principais atividades criminosas incluem extorsão, tráfico de drogas, armas e pessoas, além do roubo e comércio ilegal de veículos.

A ORCRIM El Barrio 18, surgiu na 18ª Street, em Los Angeles, essa gangue de origem mexicana aceitava imigrantes salvadorenhos em suas fileiras. Em 2005, dividiu-se em dois grupos rivais: 18 Sureños e 18 Revolucionarios. Em 2009, seus líderes solicitaram ao governo salvadorenho a separação de seus membros dentro dos presídios, pedido que foi atendido.

Assim como a MS-13, a El Barrio 18 atua em grande parte da América Central, sendo o narcotráfico e a extorsão suas principais fontes de renda.

Outro traço comum entre os membros dessas facções é a extensa cobertura de tatuagens pelo corpo, muitas das quais exibem símbolos e siglas da organização criminosa. Esse processo faz parte de um ritual de iniciação e facilita sua identificação pelas forças de segurança.

b. O Plano de Controle Territorial

O Plano de Controle Territorial (PCT) é uma estratégia governamental de nível político, abrangendo diversas expressões do poder nacional. Ele foi elaborado com base em três objetivos estratégicos: retirar El Salvador da lista de países mais violentos do mundo; levar a cabo uma guerra efetiva contra as pandillas; e tornar a paz sustentável no longo prazo, para permitir o desenvolvimento da nação.

O Plano adota uma abordagem integral, combinando a recuperação de espaços públicos dominados pelo crime, o fortalecimento das instituições de segurança e a criação de oportunidades para a população, com foco na juventude (Governo de El Salvador, 2020).

Historicamente, as Forças Armadas de El Salvador (FAES) e a Polícia Nacional Civil (PNC) conduziram diversas operações de GLO, como os planos Vigilante, Guardiães, Mão Dura e El Salvador Seguro, implementados por decretos presidenciais em períodos e regiões específicas. No entanto, essas iniciativas não conseguiram reduzir significativamente a criminalidade nem aumentar a sensação de segurança da população.

Com o agravamento da crise de segurança, o PCT foi lançado em 2019, inserido no Plano Cuscatlán do governo salvadorenho, para restaurar a ordem pública no país. Ele foi estruturado em sete fases: Preparação, Oportunidades, Modernização, Incursão, Extração, Integração e uma última fase ainda não divulgada. As etapas do plano são dinâmicas e se sobrepõem, permitindo que uma nova fase seja iniciada antes da conclusão da anterior, conferindo maior flexibilidade às forças de segurança.

A primeira fase, chamada de Preparação, teve início em junho de 2019 e foi uma das mais intensas, pois incluiu a retomada de 17 municípios sob controle dos mareros, com as FAES estabelecendo pontos estratégicos de segurança, além de patrulhas marítimas e reforço da vigilância nas fronteiras.

Em julho do mesmo ano, iniciou-se a fase Oportunidades, que expandiu a presença militar para 22 municípios, intensificou as patrulhas terrestres e marítimas e investiu cerca de 91 milhões de dólares na construção de infraestruturas e espaços culturais, como os Centros Urbanos de Bem-Estar e Oportunidades, voltados à prevenção da violência e à criação de melhores condições para os jovens.

Posteriormente, na fase Modernização, foram investidos aproximadamente 210 milhões de dólares na aquisição de equipamentos militares e policiais, incluindo viaturas, armamentos, capacetes, coletes e tecnologia avançada, aumentando a capacidade operacional das FAES e da PNC.

Em julho de 2021, teve início a fase de Incursão, caracterizada por operações conjuntas de cerco e prisões seletivas de líderes criminosos em localidades estratégicas, como Comasagua. Ademais, os controles fronteiriços e marítimos foram reforçados, resultando em grandes apreensões de drogas e armas pela Marinha Nacional, e houve a incorporação de 1.046 novos soldados às FAES. Durante essa etapa, foi implementado o Plano Transporte Seguro, que garantiu a escolta para ônibus e reforçou a segurança nos terminais rodoviários.

A fase Extração começou em novembro de 2022 e concentrou-se no cerco e captura dos pandilleros, baseando-se na mancha criminal e incentivando a população a denunciar atividades ilícitas. O cerco em Soyapango e investigações nas comunidades de Tutunichapa e La Granjita resultaram na prisão de 1.107 líderes e colaboradores das ORCRIM.

Em setembro de 2023, teve início a fase Integração, que está em andamento e busca evitar que jovens retornem às gangues por meio da criação da Direção Nacional de Integração, responsável por inserir esses jovens em atividades produtivas do país por meio de projetos sociais. A última fase do plano ainda não foi divulgada, mas especula-se que esteja relacionada à consolidação das medidas e à institucionalização das reformas de segurança.

No dia 22 de março de 2022, durante a fase de Incursão, El Salvador registrou um recorde alarmante de 72 homicídios em um único dia, a maior taxa diária de assassinatos em muitos anos. Acredita-se que essa onda de violência tenha sido uma represália das maras contra o avanço do PCT.

Diante da situação, o presidente Nayib Bukele invocou o Artigo 29 da Constituição de El Salvador, solicitando formalmente à Assembleia Legislativa a adoção do Regime de Exceção. O Legislativo aprovou a medida, suspendendo temporariamente algumas liberdades individuais, como garantias dos processos legais e direitos de associação e reunião, além de facilitar a implementação de medidas de segurança reforçadas

Art. 29.- En casos de guerra, invasión del territorio, rebelión, sedición, catástrofe, epidemia u otra calamidad general, o de graves perturbaciones del orden público, podrán suspenderse las garantías establecidas en los artículos 5, 6 inciso primero, 7 inciso primero y 24 de esta Constitución, excepto cuando se trate de reuniones o asociaciones con fines religiosos, culturales, económicos o deportivos. Tal suspensión podrá afectar la totalidad o parte del territorio de la República, y se hará por medio de decreto del Órgano Legislativo o del Órgano Ejecutivo, en su caso. (Constituição da República de El Salvador, 1983, grifo nosso).

A decisão gerou intenso debate. Enquanto grande parte da população apoiou a medida, jornalistas e organizações de direitos humanos acusaram o presidente Bukele de violar a Constituição, alegando que os 72 homicídios não seriam suficientes para caracterizar uma “calamidade general” ou “graves perturbaciones del orden público”.

No entanto, para contextualizar o impacto da violência, uma comparação pode ser feita com o Atentado Terrorista ao World Trade Center em 2001, que deixou cerca de 3 mil mortos em uma população de aproximadamente 330 milhões de habitantes nos EUA, o que representou aproximadamente 0,001% da população. No caso de El Salvador, com menos de 7 milhões de habitantes, 72 homicídios em um único dia representam a mesma proporção relativa.

Uma pesquisa realizada pela Fundação de Estudos para a Aplicação do Direito (FESPAD) revelou um alto nível de apoio popular ao Regime de Exceção. A maioria da população considera que as medidas adotadas foram necessárias para restaurar a segurança e conter a criminalidade. A análise desses dados demonstra que, embora a política de segurança de Bukele seja alvo de críticas internacionais, ela tem garantido resultados concretos na redução da violência e mantém ampla aceitação entre os salvadorenhos:

c. Resultados

Os resultados alcançados com o Plano de Controle Territorial (PCT) em El Salvador, especialmente nas áreas de Segurança Pública e Defesa, são expressivos e tem chamado a atenção de outros países latino-americanos, que começam a estudar a possibilidade de adotar estratégias semelhantes. Desde a sua implementação, mais de 80 mil criminosos foram capturados, entre integrantes e colaboradores das ORCRIM, muitos dos quais identificados por suas tatuagens alusivas às gangues a que pertencem.

Como parte das medidas para conter a criminalidade, em 2023, o governo de Nayib Bukele inaugurou o Centro de Confinamento do Terrorismo (CECOT), uma prisão de segurança máxima com capacidade para 40 mil detentos, tornando-se a maior da América Latina. O complexo foi projetado para isolar os criminosos mais perigosos e impedir a comunicação entre eles, dificultando a continuidade das atividades ilícitas dentro do sistema penitenciário.

Entretanto, as condições da mega prisão tem gerado críticas internacionais, principalmente por violações às recomendações de Direitos Humanos. As celas, projetadas para mais de 100 presos cada, possuem apenas 2 banheiros, 2 pias e 80 beliches sem colchões, refletindo uma política de encarceramento em massa que divide opiniões. Enquanto o governo defende a prisão como um símbolo do combate implacável contra o crime, organizações de direitos humanos denunciam possíveis abusos e falta de dignidade no tratamento dos detentos.

Foram apreendidas mais de 4 mil armas, das quais aproximadamente 330 eram de uso exclusivo das Forças Armadas, reduzindo significativamente o poder de combate das gangues. Além disso, cerca de 4,5 milhões de dólares em dinheiro foram capturados com os integrantes das ORCRIM e estão sendo utilizados pelo governo salvadorenho para reforçar os investimentos em Segurança Pública.

O impacto financeiro sobre o crime organizado também se fez sentir na apreensão de mais de 16 toneladas de drogas, principalmente cocaína e maconha, localizadas tanto em embarcações quanto em depósitos abandonados. Esses entorpecentes foram avaliados em mais de 400 milhões de dólares, causando um grande prejuízo financeiro às organizações criminosas.

Ademais, aproximadamente 9 mil veículos e 21 mil aparelhos celulares, utilizados pelas pandillas para coordenar suas atividades, foram confiscados, dificultando a comunicação e a logística dos criminosos.

Como consequência direta da implementação do Plano de Controle Territorial, a taxa de homicídios, que antes era uma das mais altas do mundo, caiu drasticamente. Esse declínio expressivo na violência transformou El Salvador, que antes figurava entre os países mais violentos do Planeta, no país mais seguro do Ocidente, como pode ser verificado no gráfico abaixo:

3. CONCLUSÃO

A menor nação da América Central tem passado por uma transição significativa, enfrentando a corrupção e o crime organizado de maneira incisiva, tornando-se um exemplo para grande parte dos países latino-americanos.

Em síntese, observa-se que o presidente atual declarou guerra contra as ORCRIM, que por anos dominaram áreas estratégicas do país, e implantou o Plano de Controle Territorial, mobilizando as Forças Armadas e a Polícia Nacional Civil para garantir a ordem e a segurança da população. Até o momento, os resultados obtidos demonstram a eficácia da estratégia adotada.

Conclui-se que, o planejamento tem sido executado de forma satisfatória, utilizando ferramentas jurídicas constitucionais que conferiram maior flexibilidade e liberdade de ação às forças de segurança. Como consequência, o PCT tem sido altamente bem-sucedido, reduzindo drasticamente a criminalidade e aumentando a sensação de segurança no país, que hoje se destaca como um dos mais seguros do Hemisfério Ocidental

No entanto, para que essa repressão fosse efetiva, tornou-se necessário recorrer a dispositivos constitucionais que permitiram o endurecimento das medidas de combate ao crime. A adoção do Regime de Exceção pela Assembleia Legislativa, ao suspender temporariamente algumas liberdades individuais, foi fundamental para manter a ofensiva contra as gangues.

Observa-se que, apesar dos avanços, as medidas adotadas pelo governo geram polêmicas e são alvos de críticas da grande mídia local e de organizações internacionais, especialmente aquelas ligadas à defesa dos Direitos Humanos. As denúncias de autoritarismo e violações de garantias fundamentais contrastam, no entanto, com a alta popularidade do presidente, evidenciada por sua expressiva reeleição em 2024.

Por fim, observa-se que El Salvador tem avançado significativamente nos campos político e militar, fortalecendo o combate à corrupção e promovendo melhorias expressivas na Segurança Pública e na Defesa Nacional. Resta agora a expectativa de que esse progresso se estenda para as áreas econômica e psicossocial, setores que ainda carecem de um desenvolvimento mais robusto para consolidar a transformação do país.

REFERÊNCIAS

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• Exame Mundo. Cecot, a prisão que é símbolo da luta contra as guangues em El Salvador e o trunfo político de Bukele. Publicado em 04 FEV 24. Disponível em: https://exame.com/mundo/cecot-a-prisao-que-e-simbolo-da-luta-contra-gangues-em-el-salvador-e-trunfo-politico-de-bukele/. Acesso em: 06 NOV 24.
• Wikipédia a enciclopédia livre. Nayib Bukele. Publicado e Editado em 15 OUT 24. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Nayib_Bukele. Acesso em: 04 NOV 24.