Proposta de bomba atômica no Brasil volta ao debate no Congresso

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A ideia de o Brasil desenvolver uma bomba nuclear voltou ao debate legislativo, reacendendo dilemas históricos da política de defesa nacional. Uma proposta popular de 2020, com mais de 20 mil apoios, está em tramitação no Senado e será analisada pela Comissão de Direitos Humanos. Apesar de ainda não haver apoio político para sua aprovação, o avanço da corrida armamentista global reacende o interesse por uma discussão sobre dissuasão nuclear e proteção da Amazônia brasileira.
Tecnologia e tratados: os limites da capacidade nuclear brasileira
Apesar de ser uma potência emergente no setor energético nuclear, o Brasil está juridicamente impedido de desenvolver armas atômicas. Desde 1998, o país é signatário do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), que prevê o uso exclusivo da tecnologia nuclear para fins pacíficos. A proposta que tramita no Senado, no entanto, levanta o debate sobre soberania nacional e autonomia tecnológica em um contexto internacional cada vez mais instável.
O Brasil domina o ciclo de enriquecimento de urânio em níveis compatíveis com a geração de energia — entre 3% e 5% — e avança na produção de combustível para o seu submarino nuclear, ainda em fase de testes. Contudo, a criação de uma bomba nuclear exigiria enriquecimento a níveis superiores a 90%, além de vetores de lançamento, como mísseis balísticos ou bombardeiros — capacidades que o país ainda não possui.
Além das restrições técnicas, o país enfrenta barreiras diplomáticas e geopolíticas. O desenvolvimento de armamento nuclear exigiria rompimento com tratados internacionais, fiscalização da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e reação imediata de países vizinhos e potências globais.
Participação popular e a percepção da opinião pública
A proposta legislativa surgiu a partir da plataforma e-Cidadania, que permite a qualquer brasileiro apresentar sugestões de projetos de lei. O autor, Vito Pascaretta, argumentou que a bomba serviria para dissuadir interferências externas na Amazônia e garantir maior autonomia ao país. Apesar de suas convicções, a ideia ainda não tem mobilização política significativa no Senado.
Uma pesquisa realizada em 2024 pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostrou que 47% dos brasileiros apoiariam a construção de uma bomba nuclear apenas em caso de ameaça externa real. No entanto, esse apoio cai para 27% se os Estados Unidos garantirem proteção militar ao país, indicando que o respaldo público à proliferação depende do contexto internacional.
A discussão, embora delicada, revela um sentimento difuso de insegurança e desejo de protagonismo internacional por parte de parte da população. A proposta não reflete uma vontade política consolidada, mas serve como termômetro da tensão entre os anseios por autonomia estratégica e os compromissos com a ordem internacional.
Impactos geopolíticos e a estabilidade sul-americana
Caso o Brasil optasse por desenvolver uma arma nuclear, haveria uma reação em cadeia no continente. Países como Argentina, Chile e Colômbia poderiam rever suas políticas de defesa, desencadeando uma corrida armamentista regional sem precedentes. A América do Sul, até hoje uma zona livre de armas nucleares, seria pressionada por novos arranjos diplomáticos e possíveis sanções multilaterais.
Além disso, a adesão ao TNP e ao Tratado de Tlatelolco — que estabelece a América Latina como zona livre de armas nucleares — é um dos pilares da diplomacia brasileira desde a redemocratização. Romper com esses acordos significaria isolamento diplomático, ruptura com parceiros estratégicos e possível reação econômica negativa por parte da ONU, da AIEA e de blocos comerciais.
Na prática, a proposta popular funciona mais como provocação simbólica do que como projeto viável. No entanto, revela que o Brasil, mesmo distante de ameaças diretas, não está imune ao clima global de incerteza e rearmamento, que reacende antigos fantasmas da geopolítica nuclear e coloca à prova os limites da autodeterminação estratégica de países em desenvolvimento.
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